O ano 2020 certamente ficará marcado em nossas vidas. O advento da pandemia, que acarretou mais de 1,3 milhões de mortes até o momento, sendo 165 mil só no Brasil, trouxe-nos inúmeros desafios, questionamentos e mudanças de hábitos.

O isolamento social foi necessário para conter a expansão da epidemia, evitando o colapso dos sistemas de saúde pública. Em alguns países, foi instituído um lockdown, medida de confinamento muito mais rígida do que as estabelecidas no Brasil. Ficamos em casa, houve fechamento de estabelecimentos, mas nossa liberdade de ir e vir não foi completamente cerceada. Mesmo assim, houve muita oposição a essas medidas e demorou-se bastante para adotar uma providência básica muito comum na Ásia (e símbolo de respeito ao próximo): o uso obrigatório de máscaras.

Responsabilidades Individuais e Compartilhadas no Combate à Pandemia da Covid-19
Responsabilidades Individuais e Compartilhadas no Combate à Pandemia da Covid-19 (fonte: Ian M. Mackay)

Os desafios não foram só de saúde pública, mas também de ordem econômica. Afinal, o desemprego, que já era alto antes da pandemia, aumentou. Milhares de empresas fecharam as portas. O setor de turismo e aviação foram uns dos mais afetados. Mas, quem mais sofreu com a pandemia foram os trabalhadores autônomos, que, sem o auxílio emergencial do governo, não conseguiriam sobreviver aos tempos difíceis de confinamento.

Ocorre que, além do coronavírus (Sars-Cov-2), outro “vírus” que se espalhou pela população mundial foi o da desinformação, propagada especialmente pelas redes sociais, reforçando as teses negacionistas, as dos movimentos anti-vacina e as de adeptos das variadas teorias da conspiração. Isso tudo sem falar nos vermífugos milagrosos.

  • E, por falar em conspiração, é bom lembrar que, em todas as epidemias ao longo da história, houve perseguições e buscas de supostos culpados (fonte: História das Epidemias, de Stefan Cunha Ujvari). Na idade média, por exemplo, os judeus foram associados à peste negra. A fake news da época era que os judeus teriam envenenado os poços nos quais a população buscava água (o hábito de lavar as mãos dos judeus antes das refeições fazia com que a contaminação entre eles fosse menor). Em razão disso, muitos foram torturados, proibidos de ingressar em determinadas localidades, massacrados e até queimados vivos. E, a despeito dessas atrocidades, a peste negra continuou.

Nesse contexto, é hora de ser responsável e solidário.  Não é possível retornar para o antigo “normal”, até mesmo porque ele não era assim tão “normal”. A pandemia deixou patente nossa desigualdade social, a irresponsabilidade das pessoas, o egoísmo de determinados empresários (contrários ao isolamento social só pensando no seu bolso) e a total incompetência de determinadas autoridades públicas (que, a propósito, também se movem por interesses puramente egoísticos: a permanência no poder).

É preciso mudar isso aí!

O que vai mudar nas viagens?

Obviamente, você já deve estar por dentro dos protocolos sanitários das viagens, que devem permanecer ainda por algum tempo. Usar máscaras de forma correta, evitar aglomerações, manter distanciamento e evitar contato físico com outras pessoas, lavar as mãos com frequência ou usar álcool gel e isolamento no caso de estar com sintomas são algumas medidas para evitar o contágio e propagação da Covid-19. Além disso, se for viajar para o exterior, um seguro-viagem com cobertura para Covid-19 também é fundamental.

Entretanto, não é sobre essas mudanças que gostaria de falar. Sobre esse tema, você encontra muitos textos na Internet. O que eu proponho é uma mudança na “filosofia” de viajar, ou seja, na forma como as viagens se encaixam em nossa vida.

Você já se perguntou por que você viaja? Para mim, viajar não é só distração, não é só um momento de sair da rotina. Viajar é uma oportunidade de aprender e se transformar. É uma oportunidade de rever estereótipos e se despir dos preconceitos, ou seja, abrir a cabeça! É uma oportunidade de mudar os paradigmas ou pelo menos de compreender aqueles que enxergam as coisas sob um prisma diferente do nosso.

Mas, para isso, você tem que imergir e se aprofundar sobre o destino turístico, ainda que seja a sua própria cidade. Com a pandemia, nada melhor que gastar mais tempo planejando sua viagem e lendo sobre o destino.

Como vamos viajar menos, viajaremos com mais intensidade tornando nossas viagens ainda mais enriquecedoras. Já pensou em aprender a língua do destino turístico? Já pensou em entrar em contato com algum morador local? Já leu sobre a história e a cultura do lugar? Com certeza, você vai descobrir muita coisa interessante.

  • Essas são algumas dicas que publicamos em nosso post Viagens Enriquecedoras – 11 dicas para maximizar a sua experiência de viagem.

Por outro lado, como falamos anteriormente, o viajante tem que ser responsável. A busca por destinos e atrações turísticas deve ser pautada pela responsabilidade “sanitária”, social e ambiental. Nesse sentido, é importante buscar estabelecimentos que respeitem os protocolos sanitários. É importante buscar destinos onde não há aglomerações. Evitar o overtourism. Não é o momento, por exemplo, de visitar parques temáticos. É o momento de praticar o ecoturismo, preferencialmente apoiando as comunidades locais.

Retomando as viagens passo a passo

Nossa proposta para retomada das viagens é gradual, de acordo com o a evolução da pandemia. Não sabemos se haverá uma segunda onda no Brasil, tal como já ocorre na Europa, mas já há indicativos, desde meados de outubro, de que houve uma reversão na tendência de queda no número de casos. Por isso, é melhor ter cautela.

1. Turistando pela própria cidade

Praça da Sé, Catedral da Sé, São Paulo
Praça da Sé, São Paulo

O primeiro passo para a retomada das viagens é conhecer a própria cidade. Se você mora em alguma capital brasileira, por exemplo, tenho certeza que há muita coisa para conhecer por aí que acaba passando despercebida no seu dia a dia.

Experiência própria: trabalhei no centro velho de São Paulo por vários anos e, só depois que me mudei da cidade, passei a descobrir atrações muito interessantes que ficavam ao meu lado, mas eu simplesmente as ignorava. E muitas dessas atrações (museus, centros culturais, igrejas, etc.) são gratuitas.

De fato, se você se imaginar um turista na própria cidade, certamente, descobrirá monumentos, igrejas ou edifícios que revelam muito a respeito da sua própria história e da sua própria identidade. Procure ler e se informar a respeito. Mas, não é só isso: você já pesquisou sobre as belezas naturais (rios, trilhas, parques, montanhas, praias, lagos, etc.) que estão à sua volta?

Uma vantagem de “turistar” na sua cidade é o baixo custo, já que você não precisará gastar com passagens e hospedagem. Outra é o baixo risco de contaminação. Você pode visitá-la em dias e horários em que não há aglomeração. Afinal, o tempo de exposição importa. E você estará menos exposto que se passar várias horas em aeroportos, hotéis e restaurantes.

2. Viagem de carro pelos arredores

Um segundo passo na retomada é viajar de carro nas cidades nos arredores, buscando destinos abertos e sem muita aglomeração. Ecoturismo é uma tendência. Você pode visitar uma cachoeira, um hotel fazenda (que adote medidas contra a Covid-19) ou uma praia isolada. Outra opção é visitar cidades históricas.

Viajar de carro evita o contato próximo com outras pessoas tal como ocorre nas rodoviárias, nos ônibus ou nos aeroportos.

No caso das viagens de avião, observe que, mesmo que o risco de contaminação dentro de uma aeronave seja baixo, em razão dos filtros HEPA, a aglomeração de pessoas nas salas de embarque e o fato de muita gente (impunemente) não usar máscara acaba por viabilizar a transmissão do vírus. Já contamos como foi a nossa experiência de viagem de avião durante a pandemia. Leia aqui.

3. Viajando pelo Brasil

Havendo uma significativa redução nos casos de Covid-19, você pode começar a viajar pelo Brasil, tomando voos para locais mais distantes. Mesmo assim, ainda é importante usar máscaras, evitar aglomerações e sempre higienizar as mãos.

Por enquanto, não recomendo viajar para o exterior. Sabemos que muitas fronteiras ainda estão fechadas para brasileiros e, mesmo as que estão abertas, poderão ser fechadas de uma hora para outra, ou seja, você pode ser pego desprevenido. Se isso não bastasse, o câmbio nos está bem desfavorável. De fato, o real foi a moeda que mais se desvalorizou em 2020.

Por outro lado, o Brasil tem muitos lugares interessantes. Evidência disso é o e-book “Lugares Apaixonantes pelo Brasil” que ajudamos a escrever juntamente com outros 69 produtores de conteúdo. São 135 destinos para você descobrir o nosso país, quando for possível viajar de novo, num guia de 300 páginas. Nós, do blog Classe Turista, escrevemos sobre Brasília, Pirenópolis, Chapada dos Veadeiros, Belém e Lençóis Maranhenses.

Para obter o seu e-book, basta fazer uma doação a partir de R$10. Com a sua doação, ajudaremos comunidades que trabalham com turismo comunitário, social e responsável em vários estados brasileiros (essa ação já foi encerrada).

4. Viajar para um único destino no exterior

O próximo passo é viajar para o exterior. Para isso, recomendo que aguarde a pandemia estar razoavelmente controlada no destino em questão. Isso deve ocorrer por meados de 2021. Talvez até antes disso. O ideal é que você aguarde o início da vacinação. Também é possível que, até lá, o câmbio esteja mais favorável para os brasileiros. Entretanto, não acredito que o dólar deva ficar abaixo de R$ 5.

De qualquer forma, procure conhecer um único país. Evite ficar cruzando fronteiras. Como falei, os países podem fechar suas fronteiras sem prévio aviso e sua viagem corre menos riscos se você ficar num único destino. Além disso, você pode se concentrar em aprender mais sobre aquele país e suas pessoas, pode imergir naquela cultura, e descobrir coisas que um turista comum não descobre. Isso é viajar!

Comece pelos países mais próximos. Você vai encontrar lugares e pessoas incríveis na América do Sul. Países como a Argentina, o Equador e a Colômbia já tem suas fronteiras abertas, mas sujeitas a algumas condições (verifique junto à representação consular de cada um deles).


Espero que essas dicas sejam úteis e repito: é hora de ser solidário, de ser responsável e de dar valor à vida!

Foto de Capa: Anna Shvets (Pexels.com)

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