Amsterdã, mesmo em novembro, encanta seus visitantes. A cidade se revela aos poucos, como um livro de páginas antigas e bem cuidadas, sob o céu em tons cinzentos, ora ameaçador com nuvens carregadas, ora permitindo pequenos respiros de luz entre uma chuva fina e outra.
Estive por lá em 1994 pela primeira vez e só voltei exatos 30 anos depois. Quase nada mudou, pelo menos, na paisagem das minhas lembranças. Pensando bem, uma coisa mudou: a cidade ficou bem mais cara para o viajante. E este próprio viajante também mudou, nos seus interesses e no seu estilo de viajar.


Desembarquei no Aeroporto de Schiphol e segui de trem para o bairro de Sloterdijk: um refúgio estratégico para aqueles que desejam explorar a capital holandesa sem abrir mão da tranquilidade.
Seus hotéis oferecem preços mais acessíveis, pelo menos nesta época do ano, e a estação ferroviária de Sloterdijk conecta rapidamente os viajantes, tanto ao aeroporto, quanto ao coração pulsante da cidade.
De lá, em cerca de 10 minutos, chega-se à estação central de Amsterdã, onde começa a verdadeira imersão na alma da cidade.

A Estação Central, grandiosa em sua arquitetura neogótica, é também uma das portas de entrada à cidade. Seus arredores fervilham de energia: turistas que desembarcam com olhares ansiosos, ciclistas que deslizam entre os transeuntes e trams que cortam as ruas com sua eficiência inigualável.
Amsterdã é uma cidade que se move, mas de maneira fluida, quase coreografada. Bicicletas, trams, carros e pedestres convivem em perfeita harmonia, em um balé urbano que fascina e surpreende, mesmo sob os chuviscos imprevisíveis que umedecem as ruas de pedra.

O Damrak, sempre vibrante, é um corredor pulsante que vai da estação central até o coração de Amsterdã. Talvez seja a primeira impressão de qualquer visitante.
Entre lojas de departamento, me encantei visitando o Museu do Corpo Humano, em que cada andar representa um capítulo dos livros de anatomia ou de fisiologia.

Parei na Praça Dam. De um lado, um monumento em mármore com esculturas em relevo dedicado aos mortos na Segunda Guerra. De outro, o Palácio Real, construção do século XVII que, por cerca de 200 anos, vem sendo usada para recepção de líderes mundiais e chefes de estado.

Na região de Rokin, a estátua da fonte das “duas cabeças imóveis” (Two Immovable Heads Fountain, de Mark Manders) dividia espaço com lojas sofisticadas.
Na aconchegante loja da Van Stapele, provei o famoso cookie com chocolate branco derretido no centro. Pequenos prazeres que adoçam a jornada.
Um pouco adiante, a Munttoren, com seu relógio imponente, ergue-se como um guardião do tempo, testemunha de séculos de história.
Ao seu lado, o Mercado das Flores encanta com sua explosão de cores e fragrâncias. São várias tendas com tulipas de todas as tonalidades, formando um mosaico vivo. E não estamos na primavera!

Caminhamos também pela Kalverstraat, um enorme calçadão que vai da Praça Dam até o Mercado de Flores. Repleto de lojas, o calçadão dá acesso ao Begijnhof, local de residência para mulheres religiosas conhecidas como beguinas, fundado no Século XIV.
Trata-se de uma praça rodeada por residências, onde se encontra a casa de madeira mais antiga de Amsterdã (Het Houten Huys), datada de 1420. Por lá, também se encontra uma igreja reformada inglesa (Engelse Hervormde Kerk) e uma católica (clandestina).

Já distante dali, no Rijksmuseum, a arte e a cultura encontram sua morada. Rembrandt, Vermeer e outros mestres holandeses observam silenciosamente os visitantes que se perdem em suas obras.
Cada pincelada conta uma história, cada tela é um portal para um tempo que se mantém vivo nas paredes deste museu icônico, protegido do frio e da umidade lá fora.

Mas a alma da cidade está mesmo nos seus canais, verdadeiras artérias que serpenteiam entre os prédios históricos e nos convidam a passeios despreocupados.
Naquele outono tardio, os reflexos nas águas mudavam de cor conforme o humor do clima, oscilando entre o prateado das manhãs úmidas e o grafite escuro dos fins de tarde chuvosos.

E para aqueles que desejam ver Amsterdã de outro ângulo, fazer um cruzeiro pelos canais oferece uma visão única. A bordo de um barco, o tempo parece desacelerar. A cidade, vista das águas, ganha uma nova perspectiva, e cada ponte cruzada é um convite à contemplação.

Porém, não é necessário fazer um cruzeiro para desfrutar da essência de Amsterdã. Basta seguir à pé pelo labirinto dos canais de nomes impronunciáveis: Herrengracht, Keizersgracht, Prinsengracht, Lauriergracht, Singelgracht e Outerzidjs Achterburgwal.
Caminhei, caminhei e desaguei no Rio Amstel. Estava quase na hora de voltar para casa.

Assim é Amsterdã: um mosaico de contrastes e harmonia, de movimento e calma, de história e modernidade. Uma cidade para ser sentida, vivida e eternamente lembrada. O vídeo a seguir resume essa história.